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  • Foto do escritorAldigital - Educação

A CONTRAONDA



A evolução da humanidade se faz em movimento pendular: é comum estarmos num extremo e, quando o que existe nele já não atende mais aos interesses das pessoas, migramos para o extremo oposto. E ali permanecemos, até que, de novo, fiquemos insatisfeitos com o que existe e façamos o movimento na direção contrária. Como um balanço, impulsionado uma única vez, vamos oscilando, periodicamente, entre os extremos. Mas a cada ciclo de oscilação, o impulso inicial vai perdendo a força, vamos nos distanciando dos extremos e a tendência é buscar o equilíbrio.


A par dessa imagem, também é sabido que a toda ação corresponde uma reação, nos termos da terceira lei de Newton. Tudo no Universo está agindo e reagindo, incessantemente, mesmo que a reação seja lenta e imperceptível.


Na praia observamos a onda chegar e, rapidamente, porque houve uma onda, se forma a contraonda, mantendo um movimento incessante.


Estamos vivendo, desde a década de 1980, a onda da tecnologia.


As sociedades vão se tornando cada vez mais tecnológicas. E o que isso quer dizer, afinal de contas?


Quer dizer que, a cada dia, usamos mais dispositivos tecnológicos nas nossas atividades do dia-a-dia; muitas vezes, sem nem mesmo perceber. A promessa é de facilidade e economia. As distâncias deixam de existir, muitos deslocamentos são ou evitados ou racionalizados e encurtados, o controle de várias coisas é facilitado, o acesso a informações é quase instantâneo, a comunicação é permanente, o armazenamento e a portabilidade de grande volume dados é possível e confortável, não precisamos mais ficar entediados porque sempre podemos ter distração. A lista é grande. E isso para falar de pessoas comuns. Se formos pensar nos processos produtivos, nos ensaios científicos, na saúde, nas estruturas administrativas, é quase impossível mapear todos os usos da tecnologia nas nossas vidas.


Estamos ligados à tecnologia desde que começamos a fazer ferramentas com ossos, pedras e conchas, há mais de dois milhões de anos.


Dois milhões de anos é muito tempo – para nós, humanos. A ideia de inserir novidades tecnológicas para facilitar nosso cotidiano e tornar possível determinadas coisas que não conseguiríamos atingir sem elas não é, portanto, nova. A tecnologia é um instrumento a serviço do humano desde há muito. Mesmo que dois milhões de anos seja muito tempo para nós, é fascinante ver como evoluímos nesse sentido de criar novas ferramentas para nosso bem-estar, em tão pouco tempo, se considerarmos o tempo universal.


A partir dos anos 1980, esse caminho deu um salto. E daí o termo exponencial começou a ser usado, quando se fala no assunto, porque as tecnologias baseadas na informática permitem sua replicação limitada somente pela nossa capacidade de produção, distribuição e compra.


A observação dos avanços e das potencialidades tecnológicas pode ser, mesmo, deslumbrante. De verdade! A capacidade inventiva do homem é fantástica, maravilhosa.

O que mudou em toda a nossa história a partir dos anos 1980, foi, justamente, a capacidade de difusão dessas novidades, porque nos tornamos capazes de produzir muito em tempo reduzido, devido à própria tecnologia. Por isso, o termo exponencial vem acompanhando a expressão inovação tecnológica.


A ideia central no uso desse adjetivo para se referir à tecnologia é que numa sucessão de números com crescimento exponencial alcançamos números grandes muito mais rápido que nos demais crescimentos, como o linear e o potencial, pois, em poucos passos, já estamos lidando com números muito maiores. Isso acontece porque numa sequência de crescimento exponencial de dez passos, partindo do 1, teremos: 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64, 128, 256, 512, 1.024. Ou seja, 1 se torna 1.024 em apenas dez passos, porque o resultado é sempre a dobra do número em questão.


No crescimento linear, por outro lado, partindo do 1, com dez passos, chegaríamos a 11. É claro que se continuarmos caminhando com a progressão linear também chegaremos ao 1.024, mas vamos demorar muito mais tempo. Então, quando se fala em crescimento exponencial, a ideia que se quer passar é que a bola de neve cresce muito rápido, sobretudo muito mais que no caso linear a que estamos acostumados. Talvez, isso seja certo exagero (nem tudo que brilha é inteligência artificial, por exemplo...), mas a ideia que se quer passar é que o desenvolvimento é muito rápido. Isso tudo teve muito a ver com a capacidade de processamento dos computadores, de acordo com a Lei de Moore.


Também tem sido cada vez mais comum encontrar o termo disruptiva para adjetivar a tecnologia, no sentido de identificar resultados provenientes de ideias não convencionais em determinado campo de pensamento, que aplicadas a problemas antigos ou soluções antigas, representam um salto de inovação positiva. Disrupção quer dizer interrupção do curso normal de um processo.


Com o aumento gigantesco – exponencial – da capacidade de processamento dos computadores (hoje, nosso celular tem mais capacidade de processamento do que os computadores usados para levar o homem à Lua...) e ideias originais e criativas, além do aumento significativo da capacidade de produção e distribuição de produtos, a inovação tecnológica passou a ser um bom negócio, movimentando milhões, bilhões, trilhões de dólares em todo o mundo. Também nisso houve uma passagem do linear para o exponencial.

Quando o homem percebeu que a tecnologia podia ser um ótimo negócio – ou seja, uma forma de ganhar dinheiro; muito dinheiro e muito rápido – tivemos uma inflexão nesse contexto:


até então, a tecnologia surgia e se difundia para servir ao homem, num ritmo natural, linear, na medida das necessidades humanas. A partir daí, a tecnologia começou a se alimentar dos homens, ou seja, ela precisa estar inserida na vida do maior número de pessoas possível, criando necessidades para que essa enorme capacidade de produção seja aproveitada e o negócio se mantenha. O ritmo, agora, é artificialmente induzido pelas grandes empresas de tecnologia (exponencial), não mais pelas nossas necessidades pessoais (lineares).


Logo se percebeu que seria possível ampliar ainda mais as oportunidades de negócio por meio da diversificação e sobreposição de tecnologias, de tal forma que a produção seja contínua, sem que o mercado fique saturado.


Para isso, é fundamental criar a necessidade do consumo de tecnologia de modo incessante: seja em razão de novas funcionalidades ou apenas explorando o desejo humano pela novidade.


Isso fez – e continua fazendo – com que o número de novidades disponíveis no mercado seja enorme, em quantidade e qualidade, e continuamente progressiva, entrando em todos os setores da vida.


Todos nós já ouvimos falar que as empresas que fabricam celulares têm funcionalidades desenvolvidas cuidadosamente guardadas na manga. Elas não lançam um aparelho dotado de todas as funções e capacidades que já desenvolveram, mas, ao contrário, vão incorporando as novidades aos poucos, para criar a necessidade ou o desejo de novas aquisições por parte dos usuários (eu sei, eu sei: o mesmo se diz, por exemplo, das indústrias farmacêuticas há décadas...). Se eu tenho um celular do qual eu gosto, cuja carga da bateria dura um dia inteiro, e essa mesma marca lança o mesmo celular, com pequenas variações, no ano seguinte, com uma bateria que dura cinco dias, é claro que vou trocar, ainda que não possa fazê-lo de imediato. E assim caminha a humanidade agora.


Isso cria, também, um sentido de urgência, uma sensação de que você pode ficar para trás e isso representa um risco, que as pessoas, em geral, não querem correr, quando podem. A maior vitamina do marketing é o medo...


Nesse ponto, cabe falar sobre a tal disrupção. Nos deixa em alerta, por exemplo, falar em educação disruptiva. Em especial, quando isso cai do céu como uma urgência inafastável, uma necessidade incontornável e, em especial, um benefício inquestionável...


O apelo é o de que as estruturas, sistemas e métodos educacionais existentes não dão conta dos nativos digitais, pois as gerações nascidas após a disseminação de computadores e internet, na década de 1980 em diante, não aceitam essas velharias, pois seu cérebro funciona de forma diferente e não consegue aprender com os métodos tradicionais.


Então a tecnologia em sala de aula surge como um imperativo: ou a escola inova ou morre!


Mas, passados quase 40 anos (quarenta, não quatro!), as pesquisas em diversas partes do mundo comprovam que isso não é verdade, como já expusemos em “A Mentira do Nativo Digital” (ttps://aldigitaleducacao.wixsite.com/aldigitaleducacao/post/a-mentira-do-nativo-digital). Basta procurar na própria internet e vamos encontrar pesquisas baseadas em extensa coleta de dados demonstrando o contrário. Além disso, se fosse verdade, a evolução teria sido abruptamente interrompida, visto que tais gerações foram tradicionalmente educadas e já se encontram há, pelo menos, 15 anos no mercado de trabalho e o mundo não acabou. Ao contrário, a inovação vai muito bem, obrigada!


Então é preciso ter critério quando o assunto é a inserção da tecnologia na educação.


É claro que a tecnologia tem que fazer parte da educação porque ela faz parte da vida. A questão é como.


É possível que alguém diga, quando olha para a educação no Brasil: há várias outras coisas com as quais temos que lidar no dia-a-dia do mundo adulto e do trabalho e que não são oferecidos como conteúdos programáticos, como noções de economia e finanças, culinária básica, trânsito, pequenos consertos domésticos... Verdade.


Mas o caso da tecnologia é um tanto diverso dessas outras necessidades (falaremos disso em outro post).


E, nesse ponto, é comum ouvir: “mas olhe como as crianças se dão bem com os celulares e tablets! Parecem que nasceram sabendo!” E isso seria suficiente para atestar que o cérebro delas funciona de forma diferente mesmo. Será? Os dados mostram que não.


Voltando à tal disrupção na educação, ou seja, da interrupção do curso normal do processo de educação, a primeira pergunta a ser feita é: é preciso mesmo jogar fora todos os séculos de evolução educacional em nome de testar inovações, que se multiplicam aos milhares? E inovações que, na verdade, invariavelmente, são o uso da tecnologia com roupa de inovação, mas que se limitam a mero recurso pedagógico coadjuvante: aposenta-se a lousa de giz ou caneta e adota-se a lousa digital...


Afinal, se os métodos educacionais fossem tão ineficientes, não teríamos chegado até aqui, pois foram eles que nos trouxeram. É preciso inovar na educação? Pensamos que sim, como em todas as áreas da vida humana. Mas inovar organicamente (para usar outro termo tão na moda), de forma natural e consistente.


Se prestarmos atenção, por traz dessa artificiosa cortina de fumaça, seus defensores não são capazes de demonstrar qual é o benefício da disrupção no processo educacional tradicional.

Aqui na Aldigital nós adoramos tecnologia. Mas não invertemos os papeis. Não nos deixamos cegar por ela. E se a questão é risco, há também riscos a médio e longo prazo na incorporação impensada da tecnologia em nossas vidas: extrema dependência, perda de know-how, insensibilidade psicológica, desenvolvimento de diversas patologias, concentração de conhecimento, para mencionar apenas algumas.


A disrupção na educação representa deturpação da educação.


Por melhor que seja a presença da tecnologia em nossas vidas, tudo que é demais ou é feito sem pensar, acarreta prejuízos. Todo mundo sabe que a água é essencial para a vida. A vida surgiu da água. Mas experimente tomar três ou quatro litros de água em uma hora e será acometido de hiponatremia, com diminuição severa do nível de sódio no sangue, torpor, confusão mental, convulsões e até morte. Ou mergulhe num rio ou no mar sem os devidos cuidados ou preparação... Aquilo que nos mantém vivos também pode nos matar.

Tecnologia em excesso ou seu uso impensado é prejudicial.


Muitas pessoas já sabem disso e vêm buscado combater esse mal, em diversas áreas, de acordo com os riscos mencionados. É a contraonda se formando.


Mas ela é ainda incipiente. A onda da tecnologia se assemelha, na verdade, a um tsunami: uma sucessão de ondas gigantescas. E ela ainda está na crista da onda.


Os investimentos no marketing de tecnologia são enormes e as pessoas tendem a comprar sem pensar.


Na verdade, nem se percebe que pode haver desdobramentos negativos. E muitos, na verdade, que fazem parte dessa cadeia de produção e consumo não se importam. A lógica tem sido econômica.


Nossa maior preocupação nesse contexto são as escolas, pois poucas têm condição de avaliar criticamente as novidades tecnológicas pedagógicas que são despejadas no mercado, de maneira massificante, explorando o risco e o medo. E, infelizmente, muitos donos de escola não se importam: apenas precisam de uma resposta mercadológica para não sair do jogo.


O palavrório do ensino de tecnológica é revestido de modernidade extrema, cheio de termos em inglês. Visite uma feira de “tecnologia educacional” e em dois minutos de conversa já é possível perceber a superficialidade e a preocupação exclusivamente comercial. Mas isso vende.


E o pior:


estamos passando uma falsa impressão para as nossas crianças e jovens a respeito da tecnologia e a respeito de si mesmos.


Sobre a tecnologia, passamos a sensação de que seus processos são mágicos, pois a um toque de tela, as coisas acontecem com a maior facilidade. O que não se difunde é que nisso há muitas centenas ou milhares de horas de trabalho, muito estudo, muito cálculo, muitas decisões, muita gente envolvida. É o que temos chamado de tecnologia da facilidade, que faz crer que qualquer um pode fazer qualquer coisa, porque a máquina funciona sozinha e atende todos os desejos do usuário. Será que o sintetizador de alimentos da Enterprise, quando o Capitão Kirk pedir um café, vai funcionar magicamente?


Dessa tecnologia da facilidade vem a impressão enganosa – e rentável - que passamos para nossas crianças e jovens sobre si mesmos: que são uma geração dotada de arranjos cerebrais já adaptados à tecnologia e, apenas por esse fato, já a dominam largamente, o que já se demonstrou ser um mito.


Não é necessário abandonar as vantagens tecnológicas. Mas, nós as consideramos de modo sistêmico e realista, pois, se a tecnologia parece não experimentar limites, temos que lembrar que os humanos, que a utilizam, têm seus limites. E é dessa forma que sonhamos o uso da tecnologia: de forma pensada, crítica, detida, refletida, porque só assim os papeis vão ser cumpridos, com o humano no comando da tecnologia e não a tecnologia comandando o ser humano, como o cinema já projetou há, pelo menos, três décadas!


A AlDigital faz parte dessa contraonda, com convicção e serenidade, em busca do equilíbrio, que vai proteger nossos filhos e garantir o controle humano sobre a máquina.




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